Adolescência (Netflix): quando a ficção questiona os limites da lei e da responsabilidade juvenil

A série Adolescência, da Netflix, chegou ao catálogo com uma narrativa provocadora e cheia de nuances.

Longe dos clichês comuns às produções voltadas para o público jovem, ela mergulha fundo em temas delicados como violência escolar, negligência familiar, saúde mental, redes sociais e, claro, responsabilidade penal de adolescentes.

Sob uma lente que alterna entre a crueza dos fatos e a sensibilidade dos dilemas individuais, a série desafia o espectador a refletir sobre a sociedade que molda esses jovens — e sobre as leis que buscam regulá-los.

Um olhar jurídico sobre a juventude em conflito com a lei

Um dos grandes méritos de Adolescência é, justamente, mostrar que não existem respostas fáceis quando o assunto é a conduta de menores de idade, diante de crimes graves.

A série, que acompanha a rotina de uma escola pública após um incidente traumático, lança luz sobre o comportamento de adolescentes envolvidos em situações impactantes — alguns como vítimas, outros como autores de atos violentos.

No campo jurídico, essa discussão nos leva, diretamente, ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e ao Sistema de Justiça Juvenil.

No Brasil, adolescentes entre 12 e 18 anos são sujeitos às chamadas “medidas socioeducativas”, e não ao regime penal tradicional.

A série, embora situada fora do país, instiga um debate universal: quais os limites da responsabilização penal juvenil? O que deve prevalecer: punição ou reabilitação?

A influência do ambiente: responsabilidade compartilhada?

Outro ponto interessante que a narrativa explora é a corresponsabilidade das instituições, das famílias e da sociedade como um todo. Quando um jovem comete um ato infracional, até onde vai a responsabilidade dele — e onde começa a falha do entorno?

Essa reflexão encontra eco no artigo 227, da Constituição Federal, que estabelece o dever da família, da sociedade e do Estado em assegurar à criança e ao adolescente direitos fundamentais como educação, dignidade, proteção e respeito.

Não por acaso, Adolescência mostra como a ausência de políticas públicas eficazes, a fragilidade emocional e a pressão social contribuem para um cenário onde o erro — às vezes irreparável — se torna mais provável.

Justiça, mídia e julgamento público

A série também trata da maneira como a mídia e as redes sociais interferem na percepção pública dos acontecimentos.

Um detalhe importante para o campo jurídico, especialmente diante da crescente judicialização de casos expostos publicamente.

Muitas vezes, adolescentes são rotulados, condenados ou absolvidos no tribunal da opinião pública, antes mesmo de qualquer processo legal ser instaurado.

Nesse sentido, o papel do advogado, do defensor público, do Ministério Público e do Judiciário é ainda mais desafiador: garantir o devido processo legal, preservar a imagem e os direitos dos menores envolvidos e evitar que o clamor popular influencie decisões judiciais.

Por que juristas deveriam assistir?

Para profissionais do Direito, especialmente aqueles que atuam com Direito da Criança e do Adolescente, Adolescência é mais do que uma série: é um convite à reflexão sobre os impactos das leis na vida real.

Assistir com esse olhar jurídico pode ser uma excelente forma de revisitar princípios legais, analisar a eficácia das políticas socioeducativas e repensar estratégias de atuação.

A série nos lembra que, no centro de qualquer legislação, estão vidas humanas em formação — e que a justiça precisa caminhar lado a lado com empatia, compreensão e responsabilidade.

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