A Nova Lei de Licitações – nº 14.133/2021 – traz consigo inúmeras novidades, quando comparada à Lei Federal nº 8.666/1993.
Dentre elas, encontra-se a supressão da vedação de acréscimos ou supressões contratuais, para além do limite de 25% (vinte e cinco por cento), quando definidos em comum acordo entre as partes, hipótese anteriormente vedada pelo art. 65, §2º, do regime jurídico ora revogado.
Referido artigo estipulava que, nenhum acréscimo ou supressão poderia exceder o limite de 25% (vinte e cinco por cento), estabelecido pelo mesmo artigo, em seu §1º, salvo as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes.
Pois bem. Não há, na Lei Federal nº 14.133/2021 – ainda conhecida como Nova Lei de Licitações -, dispositivo semelhante ao supramencionado, provocando o seguinte questionamento: diante da omissão da norma, quanto ao tema ora posto sob discussão, seria possível a alteração, em comum acordo entre as partes, acima do limite estipulado de 25% (vinte e cinco por cento), tanto para acréscimos, quanto para supressões contratuais?
Para respondermos, necessário se faz realizar determinados esclarecimentos, acerca do tema.
É cediço que, a Administração Pública, ao elaborar e divulgar o instrumento convocatório, esgota seu poder discricionário sobre o objeto da licitação, definido com completude na fase de planejamento da contratação, sendo certo que, os termos ali descritos se tornam vinculantes não só para os interessados e licitantes como, inclusive, para a própria Administração.
Ainda assim, face os imprevistos presentes em toda contratação, a Lei de Licitações prevê a possibilidade de acréscimo e/ou decréscimo contratual, oportunidade anteriormente esculpida no art. 65, da Lei nº 8.666/93 e, atualmente, no art. 124, da Nova Lei de Licitações.
Referidas alterações subdividem-se em alterações quantitativas (art. 124, I, alínea “b”) e qualitativas (art. 124, I, alínea “a”).
Aqui, cabe-nos estudar a primeira opção, que possui, como finalidade precípua, ajustar a quantidade original do objeto do contrato, sendo certo que, a alteração do valor deste caracteriza-se como um efeito natural dessa adequação.
Referida alteração pode ser realizada de duas formas: acréscimo e supressão, visando a primeira o aumento da quantidade do objeto originalmente contratado e a outra a diminuição da quantidade desse.
Pois bem. Cumpre mencionar que, tanto o acréscimo como a supressão unilateral encontram-se limitados, a rigor, aos percentuais máximos fixados pela norma pertinente, a saber: 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial do contrato, nos casos de obras serviços e compras; e 50% (cinquenta por cento) para os acréscimos nos casos de reformas de edifícios e de equipamento.
Nesse aspecto, nota-se que, a princípio, não houve alteração substancial em relação à disciplina que consta na Lei Federal nº 8.666/93.
Ocorre que, diferentemente da norma agora revogada, que restringia as modificações contratuais, ao estipular limites legais, a Lei nº 14.133/2021 aparenta apresentar uma maior flexibilidade nesse quesito.
A ausência de menção explícita à proibição de alterações contratuais acima do limite legal demonstra essa viabilidade a ajustes, desde que devidamente justificados e fundamentados.
Alguns doutrinadores têm reconhecido que, o art. 125, da Lei nº 14.133/2021, disciplina, especificamente, as alterações impostas de modo unilateral ou compulsório, sem apontar casos em que se evidencie a concordância entre as partes, não contemplando vedação genérica e ilimitada a toda e qualquer modificação, o que caracterizaria a possibilidade de alterações que superem os limites previstos, desde que mediante acordo entre as partes.
Não obstante o Tribunal de Contas da União ainda não ter se posicionado – de forma definitiva – a respeito do tema, doutrinadores e juristas que tratam a matéria entendem que, dada a omissão da norma em vedar, expressamente, as partes a realizarem alterações consensuais para além dos limites impostos pela lei, essas estariam, consequentemente, autorizadas.
Representaria, ao certo, uma mudança de paradigma, em relação à norma revogada, que impunha uma rígida restrição às alterações contratuais acima dos limites legais, adotando uma postura mais flexível, reconhecendo que, em determinadas situações excepcionais e devidamente justificadas, referidas modificações podem ser necessárias para o bom andamento da execução do contrato administrativo.
Cumpre ressaltar, entretanto, que, não obstante as decifrações até o momento operadas, o simples fato de se mostrar imprescindível a discussão sobre o tema, a elaboração de estudos complexos e a ponderação das matérias pertinentes ao tema, por si só, já é capaz de demonstrar que o legislador fora omisso ao não consignar, de forma expressa, quanto à legalidade ou vedação quanto a referidas alterações.
É indiscutível que, como já mencionado em momento anterior, o tema ainda se demonstra excessivamente novo, não tendo os Tribunais pátrios se posicionado, de forma definitiva, a respeito das interpretações legislativas que devem ser seguidas, bem como seus efeitos, sendo certo que, como ocorrerá com boa parte das novidades trazidas pela Nova Lei de Licitações, demonstrar-se-á essencial o início de sua aplicação prática, para que, só então, nossos julgadores sejam capazes de auferir seus efeitos reais e a necessidade de eventuais ponderações.
É fato que se identifica uma necessidade de aprimoramento ou complementação da norma, inclusive, para se possibilitar a conclusão quanto ao retrocesso ou evolução do tema, com o advento da Nova lei de Licitações.
Pode-se inferir, entretanto, que, caso constate-se que a Lei Federal nº 14.133/21 permite as alterações contratuais superiores aos limites por ela mesma impostos, desde que em comum acordo entre as partes, admitindo-se escopo de negociação particular entre os envolvidos, representa um retrocesso em relação aos avanços alcançados pela legislação pertinente, fragilizando os mecanismos de controle e facilitando a prática de irregularidades que podem comprometer a eficiência da gestão pública.
Isso porque, não obstante que apenas as alterações unilaterais, qualitativas ou quantitativas, estão delimitadas pelos parâmetros percentuais do valor inicial do contrato, fixados pela Lei nº 14.133/93, não podemos descuidar que as alterações bilaterais sejam interpretadas de forma sistemática e à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Nesse sentido, admitir o acréscimo ou supressão, em alterações consensuais e em percentuais maiores que os fixados na lei, certamente, desvirtua os parâmetros da vantajosidade e tudo o que fora estabelecido, previamente, no procedimento licitatório pertinente.
Assim, embora exista a controvérsia acima demonstrada, entende-se que as alterações contratuais, ainda que consensuais, deverão respeitar os limites previstos na Nova Lei de Licitações, inclusive, no que diz respeito aos casos de supressões contratuais, considerando que o legislador optou por suprimir a hipótese que estipulava mencionada exceção aos limites impostos pela norma.